BRASIL SANCIONA LEI 14.905/2024: ATUALIZAÇÕES SOBRE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E TAXAS DE JUROS

No dia 1º de julho de 2024, o Diário Oficial da União publicou a Lei 14.905, sancionada em 28 de junho de 2024 (“Lei 14.905/2024”), trazendo significativas atualizações ao Código Civil brasileiro no que diz respeito às regras gerais sobre atualização monetária e taxas de juros em relações contratuais e civis. Esta legislação também clarifica a não aplicação do Decreto nº 22.626, de 7 de abril de 1933 (“Lei da Usura”), a determinadas obrigações.

1. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E TAXAS DE JUROS

Nos casos em que não há previsão legal específica ou estipulação contratual, os seguintes parâmetros para atualização monetária e taxas de juros serão aplicáveis às situações de inadimplemento de obrigações:

• Atualização Monetária: IPCA, apurado e divulgado pelo IBGE, ou qualquer índice subsequente que o substitua.

• Taxas de Juros Legais: SELIC (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), com ajustes feitos mediante dedução do índice de atualização monetária aplicável. Caso o resultado seja negativo após a dedução, será considerada uma taxa equivalente a zero para o cálculo da taxa de juros no período de referência. A metodologia de cálculo e as diretrizes de aplicação da taxa legal serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central.

Adicionalmente, conforme a nova redação do artigo 591 do Código Civil:

Art. 591.  Destinando-se o mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos juros.

Parágrafo único.  Se a taxa de juros não for pactuada, aplica-se a taxa legal prevista no art. 406 deste Código.

Assim, foram removidas as limitações anteriores sobre taxas de juros e capitalização anual para contratos de mútuo com finalidade econômica. Na ausência de disposições contratuais específicas, a taxa SELIC será aplicada aos contratos de mútuo com finalidade econômica.

Destaca-se que as restrições anteriores da Lei da Usura continuam não sendo aplicáveis aos empréstimos realizados dentro do sistema financeiro nacional ou em operações do mercado de capitais, conforme afirmado na Súmula 596 do Supremo Tribunal Federal e na MP 2172-32/01.

2. EXCEÇÕES À LEI DA USURA

O art. 3º da Lei 14.905/2024 esclarece explicitamente as situações em que as limitações da Lei da Usura não se aplicam, incluindo obrigações:

• Celebradas entre pessoas jurídicas.

• Envolvendo títulos de crédito ou valores mobiliários.

• Contratadas com instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central (incluindo instituições de pagamento), empresas de leasing e empresas simples de crédito.

• Realizadas por organizações da sociedade civil de interesse público que concedem crédito, conforme a Lei 9.790/1999.

• Efetuadas nos mercados financeiro, de capitais ou de valores mobiliários.

Ferramenta de Cálculo para Cidadãos

O Banco Central disponibilizará uma ferramenta online para simular a taxa de juros legais em situações cotidianas, facilitando o cumprimento das novas regulamentações pelos cidadãos.

3. DISCUSSÃO NO STJ – RESP Nº 1.795.982/SP

No dia 6 de março, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) proferiu um julgamento de grande repercussão sobre a aplicação da taxa Selic para a correção de dívidas civis cobradas judicialmente, em substituição à tradicional correção monetária por índices inflacionários acrescida de juros de mora de 1% ao mês.

O Julgamento e a Votação Ajustada

O Recurso Especial nº 1.795.982/SP foi objeto de intenso debate entre os ministros da Corte Especial do STJ. Com uma votação apertada de 6 votos a favor e 5 contra, decidiu-se pela adoção da taxa Selic para a correção das dívidas civis. O voto divergente do Ministro Raul Araújo foi decisivo, sendo seguido pelos ministros Benedito Gonçalves, Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, João Otávio de Noronha e Maria Thereza de Assis Moura, que fundamentaram sua posição na literalidade do artigo 406 do Código Civil.

Questões Pendentes e Suspensão do Julgamento

Apesar da decisão pela aplicação da Selic, o julgamento ainda não teve seu desfecho final. O Ministro Luis Felipe Salomão levantou três questões de ordem pendentes de deliberação pela Corte:

1. A possibilidade de nulidade do julgamento devido à ausência de Ministros;

2. A definição clara sobre o método de aplicação da Selic para correção monetária;

3. A interpretação da aplicação da Selic em casos onde os juros de mora incidem antes do termo inicial da correção monetária.

Diante dessas questões, o Ministro Mauro Campbell solicitou vistas, suspendendo o prosseguimento do julgamento.

Argumentos a Favor e Contra a Selic

A adoção da Selic em substituição à correção monetária tradicional é apoiada por setores como bancos e seguradoras, que acreditam que a forma atual de atualização das dívidas judiciais não reflete a realidade econômica do país, contribuindo para a judicialização excessiva e litígios prolongados. Argumenta-se que a Selic, por ser uma taxa de referência da política monetária, proporcionaria uma correção mais justa e alinhada com o cenário econômico atual.

Por outro lado, há críticas de que a Selic não possui caráter punitivo ao devedor em caso de mora, diferentemente dos juros de mora de 1% ao mês, e que sua aplicação poderia contrariar súmulas do próprio STJ. Além disso, questiona-se se a Selic é adequada para corrigir dívidas que têm natureza pretérita, não sendo originalmente projetada para essa finalidade.

Impactos e Modulação de Efeitos

Embora o precedente não tenha efeito vinculante como os julgamentos de recursos repetitivos, sua repercussão é significativa. A decisão pode influenciar o desfecho de milhares de processos em trâmite na Justiça Estadual, especialmente aqueles relacionados a obrigações contratuais e responsabilidades civis. A modulação de seus efeitos torna-se uma necessidade urgente para garantir a segurança jurídica e o interesse social.

DATA DE VIGÊNCIA

A nova lei entra em vigor na data de sua publicação e produzirá efeitos dentro de 60 dias a partir dela, exceto pelas disposições imediatas do §2 do artigo 406 do Código Civil.

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